Há um autor cearense, já falecido, de cujos textos gosto
muito: Milton Dias. Conheci suas crônicas na época dos estudos para
o vestibular da Universidade Federal do Ceará (UFC), que incluíra o
livro Relembranças na lista de leitura obrigatória. Milton
havia sido professor da UFC.
O
estilo dele logo me cativou. Falava muito da cidade de Fortaleza, uma
Fortaleza antiga para mim, mas que parecia tão próxima. Talvez por
causa das ruas da cidade pelas quais andava sempre, sobretudo quando
fui aluno do Colégio Militar de Fortaleza e costumava ir a pé até o
centro em trajetos muitas vezes cobertos pelas crônicas
daquele mestre do relembrar.
A
nostalgia dos textos também contribuiu para a minha identificação;
de algum modo eu me sentia presente ao ler as passagens em que
contava seu amor a Fortaleza, suas reminiscências de estudante, de
professor e de homem solitário: foi um cronista da saudade.
Para mim, era
tempo de vestibular, e parecia que todas as decisões para a vida eram
tão urgentes e definitivas, e era tão forte a sensação de divergência com a
vida que levara até então, que ler os relatos tão bem escritos e
sinceros de alguém que havia passado por tanto do que viria depois
serviu como um farol, a iluminar o caminho a frente. Ajudou a colocar
em perspectiva o presente como ele era de fato e reduziu enormemente
a carga da ansiedade.
Creio
que foi naquela época que a paixão pela leitura se tornou mais
forte.
Um
de seus textos, Viagem à Praça do Ferreira, conta como ele fizera,
num certo sábado anos antes, quase o mesmo trajeto que eu fazia
sempre. Saiu na Av. St Dumont, já na altura do Colégio Justiniano de Serpa (sua
casa ficava na Rua Cel. Ferraz), em direção à praça. O motivo do
passeio? Ir até uma livraria. Foram tantas as distrações e
interrupções no caminho, que quando chegou ao destino já era meio
dia, hora do almoço, e ele teve que voltar com a promessa de sair
mais cedo de casa na próxima vez.
Fiz
muitas vezes, como disse, um trajeto que consistia em voltar pela Av.
St Dumont, saindo do Colégio Militar, em direção ao centro,
passando defronte aos colégios da Imaculada Conceição e Justiniano
de Serpa (que ficam frente a frente). Depois, continuava pelo
calçadão C. Rolim até chegar na Praça do Ferreira. Lembro do
corredor de vento que se formava quando me aproximava da Rua Gov.
Sampaio, certamente um refresco para quem andava por ali naquela
horário calamitoso de uma da tarde. Chegava à praça e corria para
a Livraria ao Livro Técnico que havia no Ed. Sulamérica,
ainda lembro do cheiro dentro dela, de livro novo, de conhecimento ao
alcance das mãos. Havia um subsolo onde estavam os tesouros quase
inalcançáveis para mim na época: os livros de xadrez da Colección Escaques.
Quando
“conheci” Milton Dias, também para mim o Colégio Militar e aqueles passeios pelo
centro já eram coisa do passado, guardavam certa nostalgia. Guardam
até hoje. O mestre cronista tinha toda razão, jamais achei um erro
em suas afirmações. E hoje, quando lembro de tudo isso, é uma
frase dele que não me sai da cabeça: “E tudo dói, quando vira
saudade”.
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